terça-feira, 13 de março de 2012

Inibições para mostrar interesse amoroso

(Texto extraído do Blog do Ailton Amélio)
Por que existem tantas pessoas solitárias em cidades grandes como São Paulo? A solidão acontece pela insuficiência na quantidade e na qualidade de relações pessoais (familiar, amistosa ou amorosa). Muita gente tem relacionamentos impessoais (lidam com outras pessoas frequentemente), mas quase não possui relacionamentos pessoais. Essas pessoas não conseguem, ou não querem transformar os relacionamentos impessoais que possuem (com colegas de trabalho, por exemplo) em relacionamentos pessoais (convidá-los para fazer alguma coisa depois do trabalho, por exemplo). Esses relacionamentos impessoais amenizam, mas não resolvem o problema da solidão
Muitas dessas pessoas solitárias têm parentes, amigos e relacionamentos amorosos, mas não os vêm com tanta frequência ou por tempo suficiente. Outras não têm um ou mais desses tipos de relacionamento. É muito intrigante observar os comportamentos  dessas pessoas carentes em locais públicos: elas não demonstram essa imensa carência, agem como se estivessem plenamente satisfeitas e não fazem nada para iniciar os tipos relacionamentos que lhes faltam. Agem como se o mais importante fosse apresentar uma imagem publica de autossuficiencia, de pessoas que não precisam de nada e são bem sucedidas. Como diz aquele ditado popular “Morrem de fome no meio da fartura”.
Na realidade, essa carência é tão poderosa que leva muitas pessoas a se produzirem, enfrentar trânsito, pagar estacionamento, enfrentar filas, pagar caro para comer e beber e dedicar horas e horas para tentar iniciar um relacionamento amoroso em "paqueródromos" (bares, baladas, danceterias, etc). Essa necessidade, no entanto, é menor do que o medo de fracassar e ser rejeitado em uma tentativa amorosa. Por isso, mesmos nestes locais, o interesse amoroso só mostrado quando existe muita seguranca. É claro que existem exceções : alguns mais desinibidos "deitam e rolam" nesse tipo de local - ficam com diversos parceiras e nunca väo embora desacompanhados!

 Dois exemplos

Exemplo 1. Proibido socializar com outras pessoas no shopping. Acabei de vir de um shopping. Neste local, não vi nenhuma pessoa abordando outras nos corredores. Os contatos entre estranhos que observei aconteceram principalmente entre os clientes e os funcionários desse local (relacionamento dos clientes com os vendedores, garçons, cobradores de estacionamentos). Outros contatos aconteciam entre frequentadores que já têm tinham relacionamentos entre si e que foram juntos ao shopping ou se encontraram lá: adolescentes amigos, famílias e casais. Mais raramente, também vi alguns homens e mulheres sozinhos circulando pelos corredores ou comendo nas praças de alimentação.
Em todas as minhas andanças pelos shoppings nunca vi uma pessoa abordar um desconhecido e dizer algo assim: “Olá! Tudo bem? Estou só aqui no shopping e simpatizei com você e gostaria de ficar um pouco na sua companhia. Quem sabe poderíamos almoçar juntos ou eu poderia acompanhar você nas compras e ajudar você a comprar. Se rolar um clima, poderemos “ficar” ou começar algo na linha amorosa. Posso ficar até com vocês duas ao mesmo tempo. Se gostarmos um do outro, poderemos ir para outro lugar. É até possível que venhamos a nos relacionar”.
Exemplo dois: Medo de mostrar interesse por estranhos nos locais de paquera! Algo mais curioso ainda acontece nos bares de paquera. Mesmo neste tipo de local parece haver um forte tabu contra o contato entre desconhecidos. Embora quase todo mundo que frequente esse tipo de lugar esteja lá para conhecer pessoas novas com a finalidade de desenvolver um relacionamento amoroso, a grande maioria dos frequentadores hesita em mostrar claramente esse tipo de interesse e tomar iniciativas eficazes para fazer contato com desconhecidos. Muita gente que vai a esse tipo de local volta para casa no final da noite sem ter conhecido ou ficado com ninguém. A grande maioria age de forma circunspecta e fica à espera que as outras pessoas forneçam garantias de interesse antes de agir. Uns poucos parecem estar se divertindo a beca, mas esse divertimento tem pouca relação com a disposição para conhecer outras pessoas: riem alto, dançam e até molestam outras pessoas como forma de divertimento.
Se um ET comparecesse a um desses bares e tentasse identificar através dos comportamentos dos seus frequentadores os motivos deles irem a esse tipo de local, ele concluiria, erroneamente, que os terráqueos vão a esses locais para ouvir música, comer petiscos e consumir muita bebida alcoólica. Concluiria, também, que a maioria das pessoas fica nas suas mesas conversando com conhecidos por longos tempos e mostram poucos sinais de interesse por desconhecidos.
O ET teria sido induzido a tirar essas conclusões errôneas porque, na verdade, quase todo mundo vai a esse tipo de local com um objetivo bem definido na cabeça: conhecer alguém que possa vir a ser um parceiro amoroso, “ficar”, arranjar companhia amorosa e não para fazer tudo aquilo que fazem o tempo todo. Porque os objetivos verdadeiros dos frequentadores desses locais quase não transparecem nas suas formas de agir?
No meu consultório, tenho trabalhado com muitos solitários, principalmente com solitários no campo amoroso. O maior motivo para as dificuldades de iniciar relacionamentos amorosos é a inibição para mostrar interesse por possíveis parceiros. Esse tipo de dificuldade surge tanto entre pessoas que já se conhecem como entre desconhecidos.
Em um estudo que desenvolvi verifiquei que 37% dos namoros eram iniciados entre pessoas que já se conheciam, 32% entre pessoas que foram apresentadas por um conhecido em comum e cerca de 20% pelo flerte entre desconhecidos seguido de abordagem. Portanto, cerca de 70% dos relacionamentos são iniciados pelos dois primeiros desses dois caminhos e cerca de 20% pelo flerte com desconhecidos seguido de abordagem (os outros 10% dos namoros começaram através de outros caminhos, entre os quais a internet). (Este estudo foi descrito no meu livro “Relacionamento Amoroso” da Publifolha).
Em um próximo artigo descreverei como ajudo os meus pacientes a superar estas inibições para mostrar interesse amoroso por conhecidos e desconhecidos.